ENGENHEIROS DO CAOS“Uma mentira pode dar a volta ao mundo no mesmo tempo que a verdade leva para calçar seus sapatos.”Mark TwainAos olhos dos seus eleitores, as *deficiências* dos líderes populistas se transformam em qualidades, sua inexperiência demonstra que não pertencem ao círculo da “velha política”, e sua incompetência é uma garantia da sua autenticidade. As tensões que causam em nível internacional são vistas como mostras de sua independência, e as fake News, marca inequívoca de sua propaganda, evidenciam sua liberdade de pensamento.No mundo de Donald Trump, Boris Johnson, Matteo Salvini e Jair Bolsonaro, cada dia traz sua própria gafe, sua própria polêmica, seu próprio golpe brilhante. No entanto, por trás das manifestações desenfreadas do carnaval populista, está o trabalho árduo de ideólogos e, cada vez mais, de cientistas e especialistas do Big Data, sem os quais esses líderes nunca teriam chegado ao poder. É o retrato desses engenheiros do caos que Giuliano da Empoli nos apresenta, através de uma investigação ampla e contundente que vai muito além do caso Cambridge Analytica e remonta ao início dos anos 2000, quando o movimento populista global, hoje em pleno curso, dava seus primeiros passos na Itália. O resultado é uma galeria de personagens variados, quase todos desconhecidos do público em geral, mas que vêm mudando as regras do jogo político e a face das nossas sociedades.DEMOCRACIA FAKEOs principais ditadores do século XX – homens como Hitler, Stalin e Mao – governaram por meio de repressão brutal. Muitos outros também impuseram ideologias oficiais e isolaram seus Estados do mundo exterior. Mas, nas últimas décadas, a face da ditadura mudou. Uma nova geração de homens-fortes bem-vestidos e versados em mídia tem redesenhado o governo autoritário para um mundo mais sofisticado e globalmente conectado. Em vez de julgamentos de fachada e campos de prisioneiros, esses líderes controlam seus cidadãos manipulando informações e falsificando procedimentos democráticos. Assim como os assessores políticos nas democracias, eles manipulam as notícias para obter apoio.Democracia Fake: A metamorfose da tirania no século XXI mapeia a ascensão de tais líderes em todo o mundo – homens como Hugo Chávez, na Venezuela, Vladimir Putin, na Rússia, e Viktor Orbán, na Hungria –, revelando a razão pela qual a maioria dos autocratas atuais diferem dos remanescentes “ditadores do medo”, como Kim Jong-un e Bashar al-Assad, bem como dos mestres da repressão tecnológica, como Xi Jinping. Expõe, ainda, como líderes como Lee Kuan Yew, de Singapura, e Alberto Fujimori, do Peru, foram pioneiros em métodos menos violentos, mais encobertos e mais eficazes de monopolizar o poder, cultivando uma imagem de competência, praticando censura oculta e usando instituições democráticas para minar a democracia, enquanto aumentavam o envolvimento internacional em prol de benefícios financeiros e de reputação pessoal.Democracia Fake oferece uma explicação para o grande enigma político de nossa era – como podem os ditadores sobreviver em uma era de modernidade cada vez mais profunda? O livro sugere por que esse novo tipo de ditadura surge, como funciona, quais são as ameaças que esses regimes representam e qual é a melhor maneira de o Ocidente reagir a eles.O GRANDE CONFRONTO Os alertas contra o regime russo liderado por Putin há muito tempo denunciavam que Moscou se preparava para a guerra. Em fevereiro de 2022, o conflito de fato teve início, com a invasão do território ucraniano pelas tropas russas. Se não havia motivo para se surpreender com a violenta decisão do Kremlin, cabe, no entanto, uma importante pergunta: como as lideranças ocidentais permitiram que essa situação ocorresse?Em O grande confronto, o membro do parlamento europeu Raphaël Glucksmann reage a essa questão fundamental. E a resposta é chocante: além da covardia de alguns – que toleraram as ingerências de Putin para evitar um conflito aberto –, parte da elite política da Europa e dos Estados Unidos se deixou corromper. Líderes alemães, italianos, franceses e norte-americanos colocaram seus interesses pessoais acima dos interesses coletivos de seus compatriotas. Em vez de trabalharem para uma transição energética livre de combustíveis fósseis, preferiram tornar suas nações dependentes dos recursos da Rússia, como petróleo e gás, em troca de um assento no conselho das estatais russas e de uma aposentadoria recheada.Glucksmann identifica esses políticos por nome, revelando os acordos políticos e econômicos obscuros que permitiram a Putin e a um conjunto de mafiosos russos fortalecerem seu poderio militar e sua influência. O autor argumenta que é hora de resistir a essa tirania. A descarbonização da economia, além de ser um imperativo ambiental, agora se torna uma arma de guerra.O grande confronto é uma leitura imprescindível para uma melhor compreensão da real dimensão dos desafios do nosso tempo.